Por Julia Viegas
O documentário brasileiro Leite e Ferro conta histórias de mães presidiárias. Ou melhor, elas contam. E são tão boas, falam com tanta desenvoltura, além de terem histórias ótimas e serem personalidades muito interessantes, que o documentário não deixa nada a desejar aos filmes de ficção. A protagonista é Daluana, presa por tráfico de drogas e mãe de Levi Pablo. Ela narra alguns fatos de sua vida de forma leve e até divertida. Não é mulher de se queixar. Pelo contrário, tem consciência e sabedoria. Como muitas outras presas, Daluana converteu-se à religião evangélica. Mas, isso não a torna uma alienada. Jesus lhe dá força e isso é belo. As crianças são lindas e o amor de mãe parece salvá-las. São mulheres que vivem uma realidade muito peculiar. Amamentam e recebem ferro, que, por sua vez, está contido no leite. Elas vivem a expectativa aflita de serem separadas de seus filhos. Pois, as crianças só ficam com elas por quatro meses. Outras "personagens" são muito interessantes, como a Jaqueline, por exemplo, que afirma ter sido melhor para ela estar presa, pois "Aqui eu posso cuidar da minha filha. Se eu tivesse do lado de fora eu ia dar ela para alguma pessoa e voltar àquela vida que eu levava (ela era viciada em drogas). Minha filha ia ficar na mão dos outros". Daluana também faz reflexões inteligentes como, no final do filme, em uma cena que mostra o ambiente externo da prisão, onde as crianças tomam banho de sol. Ela diz: "Será que ele (seu filho) entende onde ele está? Não, ele é muito pequeno. Mas, sei lá, dá uma impressão ruim, não é?". E a câmera mostra as grades. Fato que chama a atenção é que a maioria delas tem outros filhos. Uma das detentas tem dez. Outra, portadora do vírus HIV (amanhã é Dia Internacional de Luta contra a AIDS!) já está com seu terceiro filho e diz que, apesar de desejar muito, foi muito difícil engravidar do terceiro, mas ela conseguiu. Para ela foi uma vitória. É realmente outra realidade. Mulheres grávidas nas ruas apanhando de policiais, sendo presas em plena gestação, passando por situações humilhantes, desconfortáveis e de risco de morte, tanto para si quanto para os bebês. Certamente a maternidade não as faz de todo felizes. Porém, lhes é tão natural que assombra. Importante conhecer outros mundos.
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